segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

QUAL A LEGITIMIDADE DA DISCIPLINA DE VOTO PARTIDÁRIA? (II)

Nas eleições legislativas, nós, cidadãos, votamos em deputados individualmente para nos representarem. Embora estejam, naturalmente, comprometidos com o programa eleitoral consensual do partido a que pertencem, tudo o resto cabe ao seu juízo de consciência. Ou seja, aqui entram os valores que cada um defende para a sociedade enquanto cidadão eleito para pensar pela sua cabeça!

Nesta perspectiva, seria, portanto, óbvio, legítimo e legal que qualquer deputado exercesse o seu direito de voto na Assembleia da República segundo as suas opiniões sobre cada tema. No entanto, surge o choque com a realidade: disciplina de voto implementada pela direcção de uma banca que impede os seus deputados de votar consoante as suas reais convicções.

Adoptando uma postura um pouco mais compreensiva, poderíamos até respeitar as posições consensuais dos partidos, se estes as debatessem real e abertamente nos seus congressos, coisa que não acontece, servindo apenas para agitar bandeiras quando dão as 20 horas de horário nobre de televisão...

Correndo o risco de ser algo redutor: faz algum sentido, num país com um sistema supostamente democrático, que um deputado seja obrigado a votar “não” quando a sua opinião é “sim”? Gostaria de saber se os deputados socialistas (assim como de qualquer outro partido) que deliberada e conscientemente ignoraram a ordem de disciplina partidária vão ou podem vir a ser punidos…

Como é possível um político manter-se íntegro e sincero nos valores em que acredita quando é assim manipulado com um simples fantoche? Quem é que aguenta? Se calhar ninguém!... Assim se afastam cidadãos que poderiam trazer verdade e transparência à política. Já os que aguentam e ficam tornam-se iguais ou mesmo piores dos que os manipulam: elevando os patamares da arte da hipocrisia, demagogia e politiquice cor-de-rosa. É que só assim conseguem sobreviver nesta selva de interesses descarados…

Concluindo, certamente que nós, cidadãos, não votamos para que o deputado que nos representa a nossa zona geográfica seja um “Maria vai com as outras” que levanta o braço como um robot, se os colegas o acordarem da sesta; que lê o jornal desportivo na “seca” dos debates, murmurando que “o que era bom eram uns seis mesitos sem democracia”; que, quando um seu colega fala ao microfone, repete com ar sério até à exaustão, qual canção de infância, “Muito bem, muito bem!”; que “pica o ponto do dia” e vai à sua vida pré-eleitoral, baldando-se a comissões e inquéritos; que à sexta-feira vai mais cedo de fim-de-semana algaraviado logo a seguir a aprovar decisões para o resto da população apertar o cinto e trabalhar “como deve ser” (semana das 65 horas, congelamento de salários, facilitismo na obtenção anos de escolaridade, ordenados chorudos de grandes cargos de confiança política, salvação de bancos de multimilionários em risco, etc).

Às vezes, mete dó reparar nas excursões escolares de crianças que vão à Assembleia da República ver estes tristes exemplos, para quando os miúdos forem grandes… serem iguais a eles?

vascoespinhalotero@hotmail.com
(*) Psicólogo do Trabalho e das Organizações / Orientação Vocacional
Leia todos os artigos na Internet em: www.dosonhoaoprojecto.blogspot.com

QUAL A LEGITIMIDADE DA DISCIPLINA DE VOTO PARTIDÁRIA? (I)

Recentemente foi apresentada, para votação na Assembleia da República, uma proposta que defendia a legalização dos casamentos entre casais homossexuais, suscitando a questão da legitimidade da chamada disciplina de voto dentro dos partidos.

Esta proposta foi chumbada com votos contra da maioria das bancadas parlamentares do PS, PSD e CDS/PP. Houve, no entanto, votos favoráveis apresentados por alguns deputados das primeiras duas bancadas, sendo que, no caso do PSD, a liberdade de voto foi decidida. Já no caso da bancada socialista imperou a então chamada disciplina de voto.

Este último ponto constitui-se num episódio caricato e, a meu ver, grave. Segundo consta, pelo destaque que foi dado por alguma comunicação social, dentro da bancada do Partido Socialista, existiu acesa discussão, visto vários deputados terem opiniões distintas sobre a matéria a ser votada na Assembleia da República.

Foi decidido pela direcção daquela bancada que existiria disciplina de voto, reprovando a proposta apresentada e apoiada pelos partidos à esquerda do PS. Esta posição impediu, consequentemente, qualquer deputado de ter uma votação diferente, mesmo que a sua opinião não fosse aquela.

Foi definida apenas uma excepção, sustentada em critérios mal explicados, para o presidente de Juventude Socialista (organização que defende esta matéria há alguns anos, como inclusivamente chegou a constar no programa político de uma das legislaturas do então primeiro-ministro socialista Eng.º António Guterres).

Ora, acontece que, nas eleições legislativas, cada eleitor vota, não para eleger um primeiro-ministro, não para eleger uma bancada partidária, mas sim para escolher o deputado que entende melhor poder representar a sua região (no nosso caso Coimbra) na Assembleia da República, constituindo, desta forma, uma amostra representativa da população portuguesa.

Portanto, quando votamos nesse deputado temos (ou teríamos…) de ter em conta as suas opiniões próprias e não a sua mera subjugação à vontade da direcção do partido a que pertence (embora eu duvide que muita gente, na qual me incluo, saiba o nome dos deputados eleitos que representam a nossa região).

No entanto, se assim não fosse assim, bastaria estar na Assembleia da República um deputado por cada partido, possuindo uma ponderação de voto diferenciada, conforme as percentagens obtidas nas eleições, em vez de todo o grupo representativo de cada uma das regiões portuguesas! Ora, isto não é obviamente o que está previsto no nosso sistema democrático…

vascoespinhalotero@hotmail.com
(*) Psicólogo do Trabalho e das Organizações / Orientação Vocacional
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