sexta-feira, 2 de maio de 2014

ESTAR NO TRABALHO MUITO TEMPO OU TRABALHAR BEM? (1ªparte)



Nos tempos que correm, é de conhecimento comum que o Governo e troika estão a procurar implementar o aumento do tempo de trabalho em vários setores, para já com a colocação no setor público do tempo de trabalho mínimo em 40 horas semanais que são o máximo legal previsto para o setor privado. No futuro se verá o que mais…
Muita gente tem vindo a afirmar que tudo isto poderá servir apenas para prolongar turnos, cortar no pagamento de horas extraordinárias e justificar cortes de pessoal em setores importantes, cuja eficiência e eficácia no terreno começam a ser postas em causa pelos próprios utentes. Há também quem acrescente que mais horas no posto de trabalho não vão significar um mais eficaz e eficiente serviço / atendimento aos cidadãos / contribuintes, indo contudo prejudicar a vida pessoal dos cidadãos e das suas famílias que constituem, no fundo, o coração de uma sociedade.
O aumento da produtividade parece ser o fundamento apresentado pelos autores das medidas, contudo as consequências mais claramente visíveis apontam para o facto de se ir trabalhar mais tempo por menos dinheiro (quer no público, quer após ou imediatamente no privado).
Assim sendo, há que procurar respostas claras a algumas perguntas de base. Em que medida trabalhar mais ou menos horas por dia estará relacionado com a produtividade? Mais tempo, melhor produção? 1 + 1 são 2, portanto o que é preciso é “trabalhar, trabalhar”? Porém, terá a ver com o quanto se trabalha ou com o como se trabalha? E para que trabalhamos? Serão tempo de trabalho, produtividade e qualidade de vida compatíveis? É que não somos máquinas…
Relativamente à produtividade, no senso comum nacional, são facilmente identificadas, em conversas informais, certas crenças relacionadas com as possíveis razões para uma suposta lacuna, detetada nos trabalhadores portugueses. Esbatem-se argumentos que são precipitadamente tidos como científicos, que contêm normalmente uma perspetiva de causa – efeito.
Alguma ligeireza é detetada quando são avançados, quase que subliminarmente, “factos que parece que toda a gente já sabe ou devia saber” como a suposta “preguiça”, qual característica genética dos portugueses, que só poderá ser contrariada com “rédeas curtas”, no que aos direitos fundamentais de trabalho diz respeito.
Sem pensar muito, encaixa-se facilmente a lógica de que “as pessoas são mandrionas, por elas não fazem nada, só trabalham quando têm medo, portanto têm é que dar mais tempo e temos que andar sempre em cima delas”. Há sempre quem diga que já faz muito mais do que horas normais de trabalho por dia há bastante tempo e “qual é o mal de trabalhar durante mais um bocado todos os dias?”.
Normalmente a seguir a esta tomada de posição, a continuação do raciocínio varia entre: “olha eu nem noto as horas passarem, pois gosto muito do que faço, é como se fosse um hobbie e ainda por cima recebo dinheiro por isso” (clara e infelizmente uma minoria – se existir a efetiva liberdade de escolha), “que remédio, é assim na empresa, senão vamos para a rua”, “não faz mal nenhum, pois isto tem de andar para a frente”, “se há trabalho para fazer e prazos a cumprir trabalhamos as horas que for preciso, podendo ou não ser compensados depois”, etc.
Então, independentemente da fonte de motivação, trabalhar muito é sinónimo de trabalhar bem?
Faz lembrar a história que um amigo me contou sobre o lenhador que se fartava de trabalhar, chegava a serrar madeira 8, 9 ou 10 horas por dia, não tendo tempo para nada nem mesmo para… afiar a serra (o que lhe permitiria produzir em menos tempo de trabalho).
Indo mais longe, se considerarmos que a produtividade hoje em dia está mais fortemente correlacionada com a sofisticação tecnológica e não tanto ao esforço físico e presencial humano, facilmente, poderemos pensar que se o lenhador inventasse uma máquina de serrar inovadora…
Ora, em Portugal as elites parecem querer manter o lenhador a trabalhar 8, 9 ou 10 horas e o resto não interessa… Mais do mesmo, quando, afinal, podia ser melhor.

vascoespinhalotero@hotmail.com
(*) Psicólogo das Organizações / Gestão de Recursos Humanos / Desporto / Orientação Vocacional

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