segunda-feira, 17 de junho de 2013

2. UMA PAUSA NO TEMPORAL (outra perspetiva)



Há alguns meses atrás, devido a condições meteorológicas anormais que assolaram especialmente a Região Centro do nosso país, muitas áreas e populações ficaram sem luz, água, televisão, rádio, telefone fixo, telemóveis e internet durante alguns dias, nalguns casos semanas. Apesar das graves e infelizes circunstâncias, porventura, por instantes, permitiu-nos também fazer uma pausa para refletir sobre o tipo de vida que fazemos e sobre como nos habituamos a relacionar uns com os outros e com o meio envolvente.
Obviamente que naquele terrível temporal uma espécie de nó no estômago surgiu ao darmo-nos conta da dependência absoluta de vários meios para fazermos qualquer coisa, para comunicamos, para…vivermos? Houve gente que passou muito mal e pior poderia ainda ter sucedido, mas esta consciência da nossa fragilidade abriu, por momentos, uma oportunidade…
Vejamos então. Naquela altura, temas de conversa que normalmente são sempre adiados e constituem a nossa base, por um lado, de falta de planeamento, análise, conhecimento racional sobre vários temas da nossa sociedade e, por outro lado, de relacionamento/valorização/preocupação genuína emocional de uns com os outros. Por exemplo, provavelmente lembrámo-nos das tragédias das chuvas na Madeira ou do rio Mississipi em Nova Orleãs e compreendemos melhor o sofrimento daquela gente…
Indo um pouco mais longe, tivemos oportunidade para refletir sobre até que ponto as condições / bens materiais em falta (luz, água, meios de comunicação, etc) eram efetivamente fundamentais, por comparação com outros com níveis de utilidade e prazer proporcionado de facto diferentes…
Não esquecendo a base que é a liberdade individual de escolhas / gostos de cada indivíduo (desde que não prejudique outro obviamente, cada um pode gostar do que lhe apetece) podemos parar para pensar no seguinte: nesta sociedade consumista em que se gera a necessidade de ter/comprar, até que ponto ao nos termos deixado levar nesta onda não ficámos frágeis, controlados, dependentes, mais amorfos, menos humanos e… infelizes?
É certo que talvez necessitemos efetivamente de algumas coisas matérias que temos e de outras que (ainda) não temos, especialmente nesta altura de escassez financeira. Porém, talvez não necessitemos de muitas das coisas que somos levados a adquirir, afinal de contas, quem não sentiu já isso ao voltar de um super-mercado cheio de compras inúteis que não tinha planeado fazer antes de lá entrar? No entanto, com certeza que gostaríamos de ter a liberdade de escolher e não de ter de cortar à força…
Ora, naqueles dias de tempestade, estas conversas surgiram, não de modo passivo a ver os ilustres comentadores na televisão, mas sim em casa com a família, amigos, vizinhos, meros conhecidos e/ou até estranhos que não se conhecia de lado nenhum. Por alguns instantes, todos sentimos que, de facto, estávamos no mesmo barco e aí foi fácil pensar no mais importante: a vida das pessoas em primeiro lugar (o que deveria ser feito prioritariamente, como deveria ser protegida).
Este debate genuíno, embora agoniado no momento, deu-nos uma oportunidade, para dar conta que uma democracia / cidadania popular, próxima, sincera e responsável é/seria possível ou, pelo menos, mais fácil…
O que aconteceu de especial na pausa do temporal então? As pessoas puderam, precisaram e quiseram estar juntas, a falar ou a partilhar silêncios, talvez, acima de tudo, pela companhia. Para pequenas ou grandes coisas, deu-se e recebeu-se ajuda de igual para igual e sem falsas caridades, não por para parecer bem ou fazer figura, mas sim porque fazia sentido.
As pessoas comunicaram, reagiram, fizeram algo em prol de toda a gente. Sim, foram soluções de “desenrasque”, mas também houve espaço para pensar como deveriam a casa, a comunidade e a sociedade ser devidamente planeadas e geridas em conjunto e para o maior benefício possível de todos.
Claro que temos de ter noção de que aquele momento (se é que de facto aconteceu) foi um rasgo disperso, não organizado nem consequente, pois tudo passa à medida que voltamos à dita normalidade… Com o tempo, todos voltámos à nossa “vidinha”.

vascoespinhalotero@hotmail.com
(*) Psicólogo das Organizações / Gestão de Recursos Humanos / Desporto / Orientação Vocacional
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