segunda-feira, 18 de agosto de 2014

“VEMO-NOS LÁ ENTÃO…”



De vez em quando, ao longo das várias fases da vida, conhecem-se pessoas ou grupos que nos marcam, com quem sentimos na base algo especial, genuíno, natural, descontraído, profundo, entretido, como sentem as crianças enquanto brincam.
Com alguns passamos bastante tempo, com outros somente alguns instantes, mas aquele bem-estar e compreensão é percecionado e esse, de facto, parece ser o ingrediente mágico para haver uma ligação. Chamemos-lhe amor que, no fundo, se pode expressar de várias formas.
Quando estamos juntos, sentimo-nos como somos ou, mais do que isso, como nos deixamos naturalmente ser, sem termos a necessidade ou tentação de nos impormos ou publicitarmos.
Aqui não há tanto espaço para as máscaras sociais que a sociedade do estilo de vida de sucesso e para a exposição do ego que lá no fundo sabemos ser um presente envenenado…
Pode, provavelmente mais fácil e frequentemente, acontecer com pessoas que já conhecemos há muitos anos, enfim, as tais amizades de longa data, de infância ou de juventude. Mas também podemos sentir isso com pessoas de quem supostamente pouco sabemos ou até totalmente desconhecidas que nos transmitem essa sensação de paz, de deixar fluir, de (des)concentrar, desfrutar, meditar, contemplar…
Com as tais pessoas especiais com momentos especiais para nós (e há inevitavelmente tantas), partilhamos o desflorar do mundo que nos rodeia, utilizando numa frequência de onda musical os nossos sentidos (visão, audição, tato, paladar e cheiro) e talvez outros intuitivos e espirituais que o ser humano sempre abordou de forma variada e metafórica, referindo-se contudo ao…mesmo. Seja conversando, seja em silêncio, deixamo-nos ir, estar, ser…
Há quem diga que estes tipos de relações interpessoais fortes são apenas possíveis de acontecer e de manter num contato frequente, num local físico, cara a cara, olhos nos olhos, não sendo possível de iniciar e até quiçá de continuar à distância, mesmo com telefones e internet.
Devido à saudade das boas memórias partilhadas, a procura mútua mais ou menos efetiva pelo reencontro é um desafio com que salivamos cheios de ânsia, brilho e esperança. No entanto, nem sempre é fácil de ocorrer, quiçá possível e pode considerar-se até nalguns casos utópica.
Porém, não deixa de fazer sentido, pois ajuda a manter boas recordações dos laços estabelecidos, é uma quase-ilusão que preferimos manter, embora possamos reconhecer a sua pragmática dificuldade com um bom sentido de humor que ajuda a digerir a provável angústia em certos momentos em que estamos mais em baixo.
De facto, na maioria das vezes, é difícil combinar para voltar a estar com alguns amigos que há muito não se vêem. A agenda com local, data e hora não é fácil de encaixar e quando se quer marcar alguma coisa quase sempre nem toda a gente pode.
No entanto, por vezes nem se combina nada e como que por magia a malta acaba por se encontrar toda com uma suposta probabilidade de um num milhão! Às vezes é mesmo possível uma pessoa ir sozinha sem nada marcado e encontrar alguém que de quem gosta e já não vê há bastante tempo.
E há na minha terra (que tem muitas coisas de que gosto e outras de que nem tanto, como qualquer lugar do nosso planeta) um evento em que isto acontece… É a Expofacic em Cantanhede!
Não podemos esquecer que se trata de uma festa de/para massas, com uma enorme variedade de públicos-alvo a satisfazer, com alicerces populares e mesmo popularuchos nalgumas vertentes como o design e a imagem... A aposta em inovação nas áreas de negócio e na exposição do que é antigo têm sido mais-valias históricas. Os condicionamentos espaciais e logísticos têm sido driblados, ano após ano, por criatividade organizativa de enaltecer. Realmente, percebe-se o espanto quando se fala no passado e se ouve dizer: “nessa altura ainda não havia Expofacic”…
Não podemos esquecer que se trata de uma festa de/para massas, com uma enorme variedade de públicos-alvo a satisfazer, com alicerces populares e mesmo popularuchos nalgumas vertentes como o design e a imagem... A aposta em inovação nas áreas de negócio e na exposição do que é antigo têm sido mais-valias históricas. Os condicionamentos espaciais e logísticos têm sido driblados, ano após ano, por uma criatividade organizativa de enaltecer. Realmente, percebe-se o espanto quando se fala no passado e se ouve dizer: “nessa altura ainda não havia Expofacic”…
Quanto aos conteúdos em mostra anualmente no certame, há que valorizar dentro de um variado (embora também restrito) leque de gostos. Naturalmente, se nem tudo o que vem de fora é agradável, também nem tudo o que é criado na nossa zona é necessariamente interessante, mesmo que tenha o rótulo de tradição e/ou de estatuto reconhecido.
Já para quem está em início de carreira e quer apresentar coisas novas, mesmo (ou, por vezes, especialmente) sendo da terra, é complicado abrirem-se algumas portas, nomeadamente no plano musical. De facto, julgo que será importante haver oportunidades para apreciar temas originais e não covers, imitações ou dj´s que apenas repetem os sucessos da moda.
Felizmente, alguns passos já foram e estão a ser dados, julgamos que não para “parecer bem”, mas sim como desafio de seduzir mais um público-alvo (catalogado de irreverente ou festivaleiro), que pode desfrutar de criações artísticas e passar palavra, ao jeito de uma pequena “Serralves”...
Assim se pode sonhar, sabendo que tudo acontece quando se cria o tal vínculo emocional de orgulho e de pertença, de acordo com os valores e referências culturais de cada nova geração. Enfim, quando se conquista a confiança para aparecer por lá, nem que seja sozinho. A verdade é que o segredo tem estado sempre aqui…
O coração desta grande festa reside no facto de ser um ponto de (re)encontro de gerações. É, acima de tudo, por isso acontecer que esta festa foi, é e há-de ser sempre ESPECIAL para todos os que cresceram neste concelho.

vascoespinhalotero@hotmail.com
(*) Psicólogo das Organizações / Gestão de Recursos Humanos / Desporto / Orientação Vocacional

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sexta-feira, 20 de junho de 2014

NIVELAR POR BAIXO (2ª parte)


Atualmente, vivemos no dia-a-dia num ambiente de crispação devido, por exemplo, à estimulação de preconceitos, estereótipos, rivalidades invejosas e mesquinhas estre setores público e privado, deixando as elites apenas a ver passar o cortejo. Surgem os “queixinhas” a dizer que os outros têm mais migalhas do que eles e que esses devem também ficar sem nada (em vez de juntos lutarem por mais de direito).
Frequentemente temos uma sensação de que estamos numa peça de teatro com alguns personagens “coitadinhos” moralistas que desejam secretamente um apadrinhamento superior que os devolva ao lugar entre a classe alta que outrora foi seu. Crendo estes que o meio para lá chegar será apregoar uma ética coletiva de masoquismo sofredor, porque “assim é que é”.
Por ignorância, tradição social / familiar e/ou intenção manipuladora, passam-se várias frases feitas que se dizem de cor, quase de forma automático, treinada, reativa. Nestes momentos leves (que no conjunto traduzem algo bem mais profundo na sociedade) dá a sensação que não se tem noção do conteúdo e no uso que dele poderá ser feito em “nome do povo”. Uma imagem de facto vale por mil palavras e, às vezes, um conto de ficção ajuda a esclarecer a realidade.
Então, certo dia, colocaram duas rãs numa panela e meteram-na ao lume. Quando a água começou a ficar morna, ambas se sentiram relaxadas e espreguiçaram-se para gozar aquela amena temperatura. No entanto, a água foi aquecendo e uma das rãs, por instinto ou por cautela, decidiu saltar da panela e voltar ao campo onde tinha sido apanhada. Em boa hora o fez… A outra, por preguiça ou por comodismo (ou por pensar que a cozinheira até era boa pessoa) foi ficando. O quentinho sabia-lhe bem e não estava para se incomodar. A água foi aquecendo e a rã foi perdendo as forças e a vontade de saltar da panela. Quando viu a sua vida em perigo já não tinha forças para se mexer e, por mais que tentasse, acabou cozinhada…
Ora, ao aceitarmos esta subserviência, não tardaremos muito para nos convertermos em escravos agradecidos e a ter vergonha, remorsos e/ou sensação de mau carácter só de pensar em exigir que se cumpram acordos laborais prévios, direitos sociais, a Constituição, a esperança de uma vida de cabeça levantada, a liberdade…
No caso do trabalho por conta de outrem, seja no público, seja no privado, estamos a chegar a um ponto em que parece que o salário é um favor, dádiva, esmola oferecida pelo gestor. Ora, os patrões precisam tanto dos empregados como estes dos patrões, muitos para continuarem com o estilo de vida a que se habituaram legitimamente ou não. Afinal de contas, há alguma empresa que funcione sem empregados?
Desde há alguns anos que estamos a navegar na linha entre a abertura de mentalidades e a tacanhez do antigamente, no que à qualidade de vida diz respeito. Esta batalha que se tem vindo perder passo a passo institui na população, de forma massiva, a ideia do “salve-se quem puder”, do “não confio em ninguém”, de cada um por si…
Enfim, traz o que de pior há no ser humano em desespero. É o nosso carácter e o legado olhos nos olhos que passamos para as próximas gerações que que está em causa. Não na vertente da imagem que damos lá para fora, mas sim da nossa verdadeira essência, identidade, valores, alma…

vascoespinhalotero@hotmail.com
(*) Psicólogo das Organizações / Gestão de Recursos Humanos / Desporto / Orientação Vocacional

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quarta-feira, 4 de junho de 2014

NIVELAR POR BAIXO (1ª parte)


Nos tempos que correrem, vemos o argumento de equidade entre público e privado ser muitas vezes usado por Governo e Troika, entre outras elites, para justificar cortes, quer num lado, quer noutro, de uma só vez ou por fases. Enfim, o método parece simples, estica-se a corda num lado para depois poder fazer o mesmo no outro, tudo em nome da tal… equidade entre público e privado. Ficamos com a sensação ou pelo menos com a desconfiança de estarmos perante um entretenimento de dividir para reinar.
É como se pais dissessem aos seus dois filhos que, por um ter um brinquedo e o outro não, a solução seria pôr o brinquedo no lixo para ambos ficarem equitativamente… insatisfeitos. Curiosamente, este argumento é só usado por quem manda nivelar por / para baixo…
Por exemplo, numa altura em que se discute o aumento do tempo mínimo de trabalho no setor público, não será difícil adivinhar que, daqui a uns tempos, também as horas de trabalho no privado poderão ser (oficialmente) esticadas… Depois virá muita gente dizer que no público também se tem de apertar, seguida da anterior reação e assim sucessivamente até chegarmos aos níveis de exploração do tempo de vida das pessoas que se praticam em países asiáticos.
De facto não se trata sequer de aumentar a produtividade, parece pretender-se somente baixar o custo da mão-de-obra e prolongar o tempo ao seu serviço.
Um facto simples parecer comprovar esta visão. Com o fim dos contratos coletivos e as portarias de extensão, os trabalhadores do setor privado continuarão a dizer “muita sorte tenho eu se tiver trabalho” e a ser mais facilmente “espremidos”. Os colegas do público também o serão por outras vias como, por exemplo, o esvaziamento de funções da responsabilidade de funcionários públicos para justificar a extinção do posto de trabalho e o consequente, melhor ou pior disfarçado, despedimento sem justa causa e/ou, progressivamente, com ausência de indeminização…
Vale a pena recuar um pouco no tempo e recordar que, desde os primeiros governos dos anos 70 pós 25 de Abril, a aproximação entre setor público e privado era um objetivo assumido claramente, embora com aspirações positivas bem distintas… Na altura, o desafio proposto era tornar o emprego no privado equiparado em dignidade e segurança ao seu “irmão” público. Enfim, de forma genuína, procurava-se nivelar por / para cima em termos de direitos e deveres. Apenas nas últimas décadas, o conteúdo desta visão foi (propositadamente?) desvirtuado, o sentido desta aproximação inverteu-se e agora a lógica parece ser apertar no privado e depois dizer que os “malandros” do público têm de ir atrás… Ora, porque não se segue o rumo inverso hoje em dia?...
Quando algum atrevido ou ingénuo questiona o porquê de não se darem direitos (que não são privilégios, pois também contêm deveres) que foram estabelecidos no setor público ao setor privado, o que acontece? Há sempre alguém que responde “popularuchamente”: “pois, é só direitos, só direitos, então e quem paga a crise”?
Esta estigmatização social tem vindo a ser aproveitada e/ou estimulada pelos sucessivos Governos e pela troika, porém as justificações dadas para o corte destas que seriam afinal as efetivas “gorduras” do Estado (deixando de fora as verdadeiras…) colidem com alguns factos.
Senão vejamos, o peso dos salários na despesa pública é de apenas 20%, a maior fatia é concentrada em altos cargos (daí a média poder parecer elevada para o comum cidadão, mas a moda não…) e a percentagem de funcionários públicos na nossa população ativa é das mais baixas da União Europeia.
Diz-se que a riqueza é gerada pelo privado, mas também há muita riqueza desviada pelo mesmo, acima de tudo, pelo “grande” privado e não tanto pelos pequenos comerciantes, no que respeita aos números redondos.
O argumento da recessão e/ou da crise tem servido para tudo justificar, no que respeita a medidas restritivas. Muitas pessoas (embora cada vez menos) têm sido levadas a assumir como sua / nossa a culpa. Ouvimos e dizemos “nós portámo-nos mal, nós gastamos muito, nós andamos a viver acima das nossas possibilidades”, saindo a elite nacional e internacional verdadeiramente responsável de mãos lavadas no meio desta cantilena ensinada com conivência dos media comentadores. Dividir para reinar à boleia da crise…
A ratoeira perversa nesta argumentação é a de instigar que, no público e no privado, nos convençamos que temos de dar graças para termos emprego e fazer de tudo só para o manter ou arranjar, pois há que pensar na nossa família, segurança, sobrevivência…
O medo é propositadamente criado para gerar obediência cega, para que façamos o que for preciso para nos safarmos, nem que isso seja indigno, não ético, não produtivo e/ou ilegal…quer nos demos conta disso, quer (ainda) não.

vascoespinhalotero@hotmail.com
(*) Psicólogo das Organizações / Gestão de Recursos Humanos / Desporto / Orientação Vocacional

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sexta-feira, 2 de maio de 2014

ESTAR NO TRABALHO MUITO TEMPO OU TRABALHAR BEM? (2ªparte)


Sejamos honestos e realistas, a maioria das pessoas prefere trabalhar pouco tempo, mas bem, em vez de muito tempo, contudo mal. Normalmente as águas separam-se mesmo assim.
A questão aqui a merecer que paremos um pouco para pensar não é, de facto, se se deve trabalhar mais ou menos uma horita… É sim o princípio, o precedente, o rumo escolhido como solução para qualidade de vida de uma sociedade, de toda uma civilização. Se for regra, seja legal ou ilegalmente (que em muitos casos é o que acontece) não. Se for uma exceção num imprevisto que sucedeu poderá obviamente ser aceite, com bom senso, sustentada numa gestão séria e aberta. Isto desde que o azar não se torne hábito…
Não importa se é uma, duas, cinco, até poderemos trabalhar dez ou doze horas por dia legal ou ilegalmente como se faz nalgumas empresas, zonas ou países ou quiçá regressar à escravatura de 24 horas disponíveis para o patrão e/ou para colegas (infelizmente ainda existe no nosso mundo e nalguns casos perto de nós por imposição, subserviência e/ou bajulação). A política do mal menor acaba, muitas vezes, por ser a política do mal maior que não tem limites…
Porventura, o que importa será sim a forma como se trabalha durante o tempo laboral, não numa perspetiva fiscalizadora do que supostamente é trabalhar “como deve ser”, mas sim numa perspetiva de permanente procura da forma de rentabilizar recursos, atingir objetivos ambiciosos e fazer diferentes, construindo valor acrescentado.
É óbvio que toda a gente deve procurar ser eficiente e fazer um trabalho com qualidade e diligência. Não é de hoje, sempre foi assim. É uma questão de brio, o que não deverá implicar nem deve ser confundida com a subserviência de ter que “estar caladinho e fazer o que lhe mandam”.
Chegando a este ponto da análise, inevitavelmente falaremos do tipo de gestão, de lideranças, da liberdade / autonomia individual e coletiva para poder fazer bem.
É fundamental e até bastante simples estimular para a inovação, protegendo da eventualidade do erro quem está na nossa equipa, pois importa ver o que falhou e não tanto quem falhou, sabendo-se que os apontares de dedo levam ao jogar pelo seguro de fazer mais do mesmo, mesmo que errado… De facto, quem não faz não erra e só se evolui com as lições nunca mais esquecidas, aprendidas precisamente com… grandes erros.
Vejamos um exemplo quando as coisas correm bem. Quando, no dia-a-dia de trabalho, o trabalhador persegue o cumprimento ou superação de objetivos (anteriormente negociados em consenso com a sua chefia), não abandona situações/casos pendentes com clientes internos ou externos e apresenta propostas de melhoria / inovações (não apenas para um caso, mas para aspetos transversais) que julga terem boa probabilidade serem ouvidas e aprovadas.
Por estes caminhos, efetivamente responsabiliza-se pela forma como fazemos as coisas e não pelo que nos mandam fazer…
Indo um pouco mais longe e talvez ao ponto essencial de todas as polémicas, será que o foco no aumento do tempo de trabalho não serve apenas para escamotear efetivas razões de falta de produtividade relacionada com uma pobre gestão nas organizações portuguesas e falta de visão dos seus supostos líderes? Não estaremos perante uma fuga da desresponsabilização e fenómeno de bode expiatório?
Ora, se a relação entre tempo de trabalho e produtividade poderá afinal de contas ser uma questão (de) técnica poderá, assim, ficar um pouco desmistificada, não poderemos esquecer um enigma já de índole mais civilizacional…
O trabalho, sendo mais ou menos interessante, pode impedir-nos de ter tempo de... viver? Isto é, se podemos antes ou depois do trabalho usufruir de tempo de qualidade com família, amigos, educação, saúde, cultura, lazer, descontração, hobbies, férias, sono, simples descanso ou o que / como bem entendermos?
Não nascemos só para trabalhar, o tempo livre não pode ser um luxo, é um direito civilizacional e se muitos não o têm há que lutar para que o possam ter ao invés de cortar a direito e nos (auto)nivelarmos por baixo…

vascoespinhalotero@hotmail.com
(*) Psicólogo das Organizações / Gestão de Recursos Humanos / Desporto / Orientação Vocacional

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ESTAR NO TRABALHO MUITO TEMPO OU TRABALHAR BEM? (1ªparte)



Nos tempos que correm, é de conhecimento comum que o Governo e troika estão a procurar implementar o aumento do tempo de trabalho em vários setores, para já com a colocação no setor público do tempo de trabalho mínimo em 40 horas semanais que são o máximo legal previsto para o setor privado. No futuro se verá o que mais…
Muita gente tem vindo a afirmar que tudo isto poderá servir apenas para prolongar turnos, cortar no pagamento de horas extraordinárias e justificar cortes de pessoal em setores importantes, cuja eficiência e eficácia no terreno começam a ser postas em causa pelos próprios utentes. Há também quem acrescente que mais horas no posto de trabalho não vão significar um mais eficaz e eficiente serviço / atendimento aos cidadãos / contribuintes, indo contudo prejudicar a vida pessoal dos cidadãos e das suas famílias que constituem, no fundo, o coração de uma sociedade.
O aumento da produtividade parece ser o fundamento apresentado pelos autores das medidas, contudo as consequências mais claramente visíveis apontam para o facto de se ir trabalhar mais tempo por menos dinheiro (quer no público, quer após ou imediatamente no privado).
Assim sendo, há que procurar respostas claras a algumas perguntas de base. Em que medida trabalhar mais ou menos horas por dia estará relacionado com a produtividade? Mais tempo, melhor produção? 1 + 1 são 2, portanto o que é preciso é “trabalhar, trabalhar”? Porém, terá a ver com o quanto se trabalha ou com o como se trabalha? E para que trabalhamos? Serão tempo de trabalho, produtividade e qualidade de vida compatíveis? É que não somos máquinas…
Relativamente à produtividade, no senso comum nacional, são facilmente identificadas, em conversas informais, certas crenças relacionadas com as possíveis razões para uma suposta lacuna, detetada nos trabalhadores portugueses. Esbatem-se argumentos que são precipitadamente tidos como científicos, que contêm normalmente uma perspetiva de causa – efeito.
Alguma ligeireza é detetada quando são avançados, quase que subliminarmente, “factos que parece que toda a gente já sabe ou devia saber” como a suposta “preguiça”, qual característica genética dos portugueses, que só poderá ser contrariada com “rédeas curtas”, no que aos direitos fundamentais de trabalho diz respeito.
Sem pensar muito, encaixa-se facilmente a lógica de que “as pessoas são mandrionas, por elas não fazem nada, só trabalham quando têm medo, portanto têm é que dar mais tempo e temos que andar sempre em cima delas”. Há sempre quem diga que já faz muito mais do que horas normais de trabalho por dia há bastante tempo e “qual é o mal de trabalhar durante mais um bocado todos os dias?”.
Normalmente a seguir a esta tomada de posição, a continuação do raciocínio varia entre: “olha eu nem noto as horas passarem, pois gosto muito do que faço, é como se fosse um hobbie e ainda por cima recebo dinheiro por isso” (clara e infelizmente uma minoria – se existir a efetiva liberdade de escolha), “que remédio, é assim na empresa, senão vamos para a rua”, “não faz mal nenhum, pois isto tem de andar para a frente”, “se há trabalho para fazer e prazos a cumprir trabalhamos as horas que for preciso, podendo ou não ser compensados depois”, etc.
Então, independentemente da fonte de motivação, trabalhar muito é sinónimo de trabalhar bem?
Faz lembrar a história que um amigo me contou sobre o lenhador que se fartava de trabalhar, chegava a serrar madeira 8, 9 ou 10 horas por dia, não tendo tempo para nada nem mesmo para… afiar a serra (o que lhe permitiria produzir em menos tempo de trabalho).
Indo mais longe, se considerarmos que a produtividade hoje em dia está mais fortemente correlacionada com a sofisticação tecnológica e não tanto ao esforço físico e presencial humano, facilmente, poderemos pensar que se o lenhador inventasse uma máquina de serrar inovadora…
Ora, em Portugal as elites parecem querer manter o lenhador a trabalhar 8, 9 ou 10 horas e o resto não interessa… Mais do mesmo, quando, afinal, podia ser melhor.

vascoespinhalotero@hotmail.com
(*) Psicólogo das Organizações / Gestão de Recursos Humanos / Desporto / Orientação Vocacional

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terça-feira, 14 de janeiro de 2014

PAUSAS NO TRABALHO



Hoje em dia, num clima de incerteza quanto ao futuro social, económico e cultural em que vivem várias organizações públicas e privadas, a tensão e ansiedade acumuladas são grandes, bem como a vontade de encontrar algo a que nos possamos agarrar para tornar útil e focada a revolta que se sente de forma generalizada.
Neste ambiente incandescente, muita gente distribui juízos e sentenças sobre direitos básicos do comum cidadão como se fosse aí que estivesse a razão dos buracos financeiros que a grande corrupção portuguesa e estrangeira criou. Muitas pessoas parecem reafirmar o seu desejo de candidatura ao posto de capataz que urge, segundo a sua postura, criar para pôr todos os mandriões na linha. Esta melodia arranhada só é, ocasionalmente, engasgada quando algum atrevido questiona mais a fundo sobre o seu efetivo conhecimento acerca da realidade técnica, humana e de liderança associada às funções desempenhadas pelos visados…
Após um sonoro “chega para lá” disfarçado de feitio, o timbre regressa mais robusto, apresentando como às de trunfo o seu exercício voluntário de vigilância das práticas laborais para com aqueles que andam ali, que não fazem nada e que deviam era ficar lá até à noitinha.
Prossigamos nesta perspetiva. Frequentemente quem (auto)louva e cobra o sacrifício de longas horas de trabalho e quem “convida” os outros a terem semelhante postura só assume para consigo mesmo que o real aproveitamento das longas horas de trabalho é, de facto, muito relativo…
É precisamente esta gestão eficaz e eficiente do tempo de trabalho que pretendo, sem demagogias, com o leitor conversar. Ora, mesmo tendo em conta a variedade de profissões, tarefas, responsabilidades, prazos e objetivos, afirmar-se que se está sempre a trabalhar é a provavelmente maior ilusão do mundo laboral em qualquer parte do planeta.
É certo que haverá quem diga que há abusos e terá, em parte, razão, mas serão sempre casos pelos quais a restante maioria não pode pagar, sendo injusto colar-lhe um rótulo. Não raras vezes quem aponta o dedo é precisamente quem mais longas pausas faz (basta chamar-lhe outro nome, quiçá… parte do trabalho).
Há que ser honesto e realista, é inevitável ter que se fazer pausas no trabalho para gerir o cansaço. Vejamos. Nas escolas, as crianças e adolescentes têm aulas com duração limitada de 50 ou 90 minutos, devido à necessária gestão do “picos” de esforço, concentração e saturação. Obviamente que também os seres humanos mais velhos precisam de parar de vez em quando, pois não somos máquinas que trabalhem com afinação total ao longos de horas a fio.
São necessidades efetivas quer em termos de saúde (o que por si já é mais do que suficiente), quer precisamente em termos de efetiva produtividade. A respeito desta última, sejamos claros, esta será mais alta se o produto resultante for melhor e não necessariamente se se estiver mais tempo por ali. É, de facto, preciso “respirar” um pouco, ficar mais aliviado, poder regressar mais tranquilo ao trabalho e fazer mais e melhor na sua organização, para render!
Se é necessário pedir desculpa por este “crime”, então rigorosamente todos teremos de o fazer, pois qualquer pessoa o faz, quer o admita quer não. Quem disser que consegue estar sempre ultra concentrado, não está a ser sincero… Ou encaramos isto com naturalidade ou nos iludimos na suposta proibição, acabando por incentivar apenas um melhor ou pior faz de conta…
Por outro lado, parece que só certos conteúdos são aceites socialmente para se ter permissão para uma pausa, tais como… fumar! Então e quem não fuma? Fará sentido estar a averiguar o que se vai fazer no tempo legítimo de pausa para permitir ou não que esta seja concedida? Será que uma pessoa não tem direito à pausa e o que faz nesse tempo ser assunto seu? Senão qualquer dia toda a gente fuma ou finge que fuma…
Julgo que o que se faz com esse tempo de pausa diz respeito à liberdade pessoal de cada um, seja conversar, comer ou beber qualquer coisa, brincar com os colegas, cumprimentar amigos ou simplesmente não fazer nada nesse curto período. Qual é o mal?
Indo mais longe, a efetiva necessidade de uma “permissão” superiora é, na minha opinião, muito questionável, o que não quer dizer que a pausa não possa ser comunicada e exercida em momentos que não ponham em causa o serviço.
Portugal é um dos países da União Europeia em mais horas se trabalha por dia (ou está mais tempo no local de trabalho), mas com níveis de produtividade por hora mais humildes. Por outro lado, os portugueses que têm de sair do seu país são reconhecidos no estrangeiro pelas suas competências, criatividade e ânimo no trabalho.

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