sexta-feira, 11 de junho de 2010

FORMA VERSUS CONTEÚDO: AS MENTALIDADES… (1ª parte)

Há tempos, em conversa, ouvi dizerem que o baixo ritmo de desenvolvimento e de eficiência/eficácia na realização de projectos estruturantes, no nosso país, se deve a uma questão de mentalidades e que é complicado mudar. Enfim, que é difícil pensarmos as coisas de raiz e com forte envolvimento social, numa fase inicial, para evitar “broncas” por mau planeamento e despesismos absurdos…

Concordei em parte, pois não acredito, de forma alguma, que o nosso código genético nacional esteja fatalmente carimbado pela corrupção e autoritarismo. Porém, o que é certo é que isto se passa e impede que haja efectiva participação e envolvimento de todos, na fase de planeamento de grandes projectos realmente estruturantes.

E porquê? Na minha opinião, pelo menos parcialmente, devido ao facto de os portugueses valorizarem o parecer em detrimento do ser. Quantas vezes não ouvimos (sabiamente?...) dizer que não basta ser, é preciso parecer? E paradoxalmente (ou talvez não?...) ouvimos também alguns a queixarem-se do lusitano excesso de aparência e fachada.

Mas o que é certo é que, hoje em dia, na nossa sociedade, quem te mais jeito para o “teatro social” parece levar vantagem… E mesmo quem aposta muito no ser começa, ao longo do tempo, a render-se à conjugação com o parecer até que… fica só com o parecer! Geralmente, nesta altura diz-se que a pessoa está mais madura… E estará realmente?...

Em Portugal, agora e talvez desde há muitos séculos atrás, parece haver esta preocupação com a imagem (para o exterior, mas também a nível interno). Uma espécie de guerra sussurrada de forma (parecer) versus conteúdo (ser). Aqui se criam barreiras de preconceito que nos cegam e destroem a capacidade de mobilização social genuína em torno de grandes projectos estruturantes (do ser e não do parecer…). Assim nos condenamos aos nossos tais defeitos supostamente congénitos abordados no início desta reflexão.

Haja alguém que me explique com dados científicos: por que é que exactamente a mesma opinião dita por uma pessoa humilde, simples e sincera não há-de ter tanta credibilidade quando é dita por uma pessoa algo arrogante, de fato e gravata, “nariz empinado” e tom verbal pomposo?

Por que é que, em Portugal, a maioria das pessoas aparentemente prefere a ilusão da imagem (que dá sempre, mais tarde ou mais cedo, muitas contas para pagar…) à realidade do conteúdo?
No entanto, sejamos razoáveis, é certo que tem que haver um mínimo de cuidado com a imagem, mas daí até isso ser mais importante que o conteúdo vai uma longuíssima distância! Por que não seguimos os exemplos dos espanhóis ou dos suecos que se tratam entre eles por tu e não cultivam as expressões do género de “excelência”, “doutor”, etc?

Esta questão da forma versus conteúdo pode parecer, à primeira vista, meramente “castiça”, mas a verdade é que está ligada ao cerne de muitos buracos estruturais e de falta de coordenação/cooperação a nível local, regional e nacional com diferentes graus de consequente prejuízo para os cofres do Estado…

Na minha opinião, o medo de dar má imagem (seja para vizinhos, comunidade, país, estrangeiro, etc) é um dos principais factores responsáveis por os portugueses não participarem e/ou reivindicarem mais e, principalmente, melhor (sem sectarismos de classes). É que depois são “obrigados” a calar e consentir para…

vascoespinhalotero@hotmail.com
(*) Psicólogo do Trabalho e das Organizações / Orientação Vocacional
Leia todos os artigos na Internet em: www.dosonhoaoprojecto.blogspot.com

Sem comentários: