terça-feira, 2 de janeiro de 2007

Interpretar construtivamente o sofrimento no trabalho


Quando a relação homem-organização do trabalho fica bloqueada, como vimos no meu último artigo, entra-se no domínio do sofrimento dos trabalhadores, sendo necessário então interpretar o modo como os trabalhadores reagem a esse sofrimento. Pois é precisamente nesta reacção ao sofrimento que nascem o mau serviço, as más relações dentro do trabalho, absentismo, doenças no trabalho, stress (e consequentemente a baixa produtividade...), que, no fundo, não são uma “doença” (que no universo cultural português muitas vezes desplicentemente se aponta aos funcionários públicos), são sim, um sintoma que nos sugere a “doença”: a falta de negociação, invenções e acções entre os trabalhadores e seus superiores sobre a própria organização do trabalho!

O indivíduo, neste caso o trabalhador, dispõe de muitas vias de descarga da sua energia. Essas vias de descarga são três: via psíquica, via motora e via visceral. A primeira é saudável, enquanto que as duas seguintes nem sempre são.

Segundo Freud (1968), tomado pela sua energia pulsional direccionada para o trabalho, um sujeito pode eventualmente produzir criatividade e envolvimento, que são representações mentais que podem, às vezes, ser suficientes para descarregar o essencial da tensão interior.Outro sujeito não conseguirá relaxar-se por esse meio e deverá utilizar a sua musculatura: fuga, crise de raiva motora, actuação agressiva, violência, oferecendo toda uma gama de “descargas psicomotoras” (quem não viu já pessoas a “explodirem” por causa do trabalho?).

Enfim, quando a via mental e a via motora estão fora de acção, a energia pulsional não pode ser descarregada senão pela via do sistema nervoso autónomo e surgem então as doenças psicossomáticas (fadiga crónica, depressão, entre outras são geralmente mais comuns em pessoas que não “explodem” como no exemplo anterior).

Mas que tipo de trabalho ou formas de estar no/com o trabalho darão ao Homem possibilidade de não sofrer neste contexto? É deixa-lo não fazer nada? Isso é que era bom, diriam alguns! Ora bem, o psiquiatra francês Cristophe Dejours sugere uma abordagem que aproxima a Psicopatologia do Trabalho e a Ergonomia, apontando três respostas: a primeira é a possibilidade de participação na organização do trabalho; a segunda diz respeito à liberdade / autonomia no trabalhar dentro da organização; a terceira é a autêntica orientação vocacional.

O trabalho torna-se perigoso para o aparelho psíquico quando ele se opõe à sua livre actividade. Ou seja, quando as regras são impostas sem serem explicadas e negociadas abertamente e as contribuições, sugestões e participações dos trabalhadores permanecem olhadas com desconfiança! Cai assim o mito de que “os trabalhadores gostam é de não fazer nada”!
Questões / críticas / sugestões – vascoespinhalotero@hotmail.com

Sem comentários: