terça-feira, 2 de janeiro de 2007

Mudar ou mudar "devagarinho"?


Há tempos, ouvimos o nosso Ministro das Finanças afirmar, com confiança, acreditar que dentro de pouco tempo será concluída uma mudança cultural, já em evolução, no nosso país, no que diz respeito aos cumprimentos fiscais: o abandono do “chico espertismo” da fuga aos impostos para passar ao cumprimento geral da população com discriminação forte a quem não o faz!

Com medidas cada vez mais rigorosas (talvez na opinião de alguns falte o levantamento do sigilo bancário), este facto poderá mesmo em breve ser uma realidade, sendo que actualmente já conseguimos ver que algo está mesmo a alterar-se neste ponto vital do desenvolvimento nacional e as pessoas começam a acreditar que é mesmo possível! Atenção que com isto não quero comentar a actuação do Governo, mas sim citar apenas este exemplo em particular!

Porém, há bem pouco tempo atrás, este fabuloso exemplo seria tido como culturalmente impossível numa qualquer conversa de café. O que pensavam as pessoas na altura? Basicamente dividam-se em dois grupos. As mais resignadas diziam “neste país sempre foi assim, não dá para mudar”, confidenciando, com um sorriso nos lábios, que só se “abrissem a cabeça às pessoas”! Outras, supostamente pessoas mais interventivas, alegavam que as “mentalidades” tinham que mudar e que só se poderia fazer isso “devagarinho”...

Ora, se o primeiro conjunto de pessoas assumidamente nada fazia, o segundo conjunto confiava numa mudança gradual “milagrosa”, nada fazendo porém, esperando que viesse tudo do “céu aos trambolhões”! Ouviam-se risadas cúmplices e amargas de uns e viam-se olhares cabisbaixos e apreensivos de outros. Mas a conclusão nos dois grupos era a mesma: não é possível mudar, portanto, caso encerrado e tudo ficava na mesma!...

Porém, neste caso, por exemplo, as coisas estão mesmo a mudar, embora não devamos “por a carroça à frente dos bois”. Resumindo, esta era uma mudança consensualmente pedida, impossível para alguns, que supostamente necessitaria de alterações “milagrosas” de longo prazo de “mentalidades”, mas o que é certo é que aconteceu e mais rapidamente do que se estaria à espera! Mas como é que se conseguiu?

Sucedeu que um terceiro grupo de pessoas assumiu a necessidade imediata de mudança (que já era reclamada pela maioria das pessoas na sociedade portuguesa, se bem que de formas diferentes...), recolheu opiniões e sugestões de métodos e critérios consensuais e simplesmente actuou com confiança e legitimidade. Ou seja assumiu-se que era mesmo para mudar e não para se ir supostamente mudando “devagarinho” por causa das “mentalidades” (no fundo será mais receio das resistências...). Este é apenas um exemplo de como se pode mudar a sério, com sucesso e a curto prazo: com “garra”!

Mas atenção, não parecerá esta “garra” para mudar uma imposição ditatorial? Não, existe uma enorme diferença relativamente à mudança autoritária que se constitui na possibilidade de participação, de dar voz a quem quiser sugerir (e não só destruir), de recolher opiniões construtivas para criar consensos de forma organizada e regular. Enfim, ouvir e responsabilizar na mudança que é sugerida consensualmente. E isto basta? Não. Depois há que agir com confiança, mudar sem receio, pois a razão aí já está do nosso lado, o apoio das pessoas também e nesta fase não as podemos defraudar...

No que diz respeito ao envolvimento das pessoas há que ter em conta um pilar de base: existe a “maioria silenciosa” (que não participa, nem sugere ou se responsabiliza) e a “maioria silenciada” (que pretende ser parte activa da mudança e que encontra um, muitas vezes “burocrático” e “pouco ruidoso”, não!).

E quando se volta atrás num processo de mudança participado? A pessoas que participaram não voltam a participar juntando-se à “maioria silenciosa”. As pessoas que não participaram ficam orgulhosas de não o ter feito e ganham “estatuto” para dar o seu exemplo à “maioria silenciada”. Os lideres e suas equipas que propuseram e trabalharam na mudança tornam-se “reféns” de uma nova autoridade agora criada: a “maioria orgulhosamente silenciosa”! Esta nova maioria impedirá para sempre e com muito mais facilidade qualquer tentativa de mudança consensual e tudo ficará para sempre na mesma para desgosto da esmagadora maioria das pessoas!

É óbvio que resistências a qualquer mudança surgem sempre e são humanamente inevitáveis, até mesmo em pessoas que concordaram com ela. Mas podem até ser positivas se servirem de exemplo, sabendo lidar-se com elas (quer os casos negativos, quer os positivos). E como lidar com as resistências à mudança? Primeiro, nunca alterando decisões consensuais tomadas em função de casos individuais. Segundo, com uma postura aberta e humilde, dando exemplos positivos do que se vai conseguir no futuro, lembrando exemplos negativos do que não se conseguia no passado, explicar, ouvir, oferecer ajuda nesta fase de passagem, etc. Enfim, compreender a dificuldade e resistência, mas sem voltar atrás ou deixar tudo como estava!

Ao longo da nossa História, as mudanças respeitadas sempre se deram com este terceiro grupo a “puxar”, a arriscar, a explicar, a inovar com humildade para ouvir e garra para avançar! Basta pensarmos num bom exemplo de envolvimento e “mãos à obra” colectiva portuguesa. A população portuguesa foi, a nível europeu, das que mais rapidamente se habitou à mudança de moeda escudo – euro! Este facto só por si motivo de orgulho, leva-nos aos pícaros do nosso ego se recordarmos que infelizmente estamos na cauda da europa a nível de alfabetismo, índices de escolaridade e formação! Uma gigantesca mudanças de “mentalidades” que não precisou de ser feita supostamente “devagarinho”...

vascoespinhalotero@hotmail.com

1 comentário:

Unknown disse...

paraben Sr. Dr. Vasco pelo blog, estou sobrio e com bom gosto ;) Boa continuação..